segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013


Terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Doença de Huntington – Por Allefy Beltrão

A doença de Huntington (homenagem ao pesquisador que a descreveu), ou Coréia, é uma síndrome extrapiramidal e neurodegenerativa progressiva de caráter genético com uma incidência de 3 a 8 casos por 100.000 indivíduos. No geral, caracteriza-se sindromicamente por movimentos involuntários e rápidos (coréicos) e alterações de cognição e personalidade que se manifestam por volta dos 40 anos de idade. O diagnóstico pode ser feito mediante análise da história clínica do paciente e observação de postura e marcha deste, além da utilização da técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR) que permite detectar a alteração no gene IT15, fator responsável pela síntese da proteína alterada que é responsável pela doença.

                                                      

 A afecção é resultado da expansão de uma trinca de bases localizadas na região 5’ do gene IT15 do cromossomo 4 e resulta na produção de uma proteína huntingtina(htt) mutante. Seu padrão autossômico dominante com penetrância completa faz com que o indivíduo que possua um único alelo para a doença, a manifeste na vida adulta. Portanto se um dos pais possui o gene em questão, seu filho terá 50% de chances de portá-lo da mesma forma e manifestar a DH em algum momento de sua vida. No entanto, caso o descendente não herde o segmento de DNA em questão, não sofrerá de huntington nem a transmitirá para a geração seguinte. A manifestação da doença pode ser precoce ou tardia e o teste que permite detectar uma predisposição do indivíduo pode ser feito previamente.

             
                                 

 A destruição anormal de neurônios nos territórios cerebrais correspondentes aos gânglios da base é a grande responsável pelo aparecimento dos sintomas iniciais como as perdas cognitiva e emocional. A doença é progressiva e manifesta outros sintomas com o decurso do tempo. Logo o indivíduo desenvolve movimentos abruptos, adventícios, rápidos e dotados de bastante inquietação (Coréia), em especial nos olhos, boca e membros superiores, o que caracteriza a fase mais incômoda da doença, onde por mais que o portador queira parar de executar movimentos tão ridículos, alguma “força oculta” parece ordená-lo a não parar. Alterações de personalidade parecem também ser bastante comuns na fase inicial, as quais tornam o doente totalmente desconecto em relação à comunicação que mantinha com o ambiente a sua volta. No progresso da doença, a distonia e a bradicinesia podem ser recorrentes, esta última podendo aparecer também no estágio final em que pode vir associada à rigidez, o que pode acarretar acinesia, um quadro bem mais delicado e crítico.

                                              

 A ida do paciente coréico ao especialista pode ser fracassada caso ele esteja no estágio inicial, onde muitas manifestações diferencias ainda não ocorreram. Muitas vezes alguns movimentos abruptos são diagnosticados pelo médico como simples tiques sem nenhuma razão mais grave. Exames de imagem como uma TC também podem não conseguir diagnosticar algum processo degenerativo. A marcha coréica acompanhada de alguns distúrbios cognitivos e de personalidade prematuros podem ser o diferencial para o médico em sua primeira suspeita. Outro sintoma bastante recorrente no estágio inicial e que facilita a captação na análise do médico é a incapacidade do paciente em realizar movimentos seqüenciais de maneira correta ou movimentos simples rapidamente. Outra manifestação que pode ser precoce é o aparecimento de reflexos hiperativos. O reflexo plantar em extensão mais comumente aparece de maneira tardia, acompanhado de clônus, em estágios mais avançados. Ao observar  todos estes sinais iniciais que envolvem postura e comportamento, o médico deve formar um heredograma a partir da história clínica da família do seu paciente e saber se algum integrante da família dele foi acometido pela DH. Após a análise genealógica poderá solicitar exames moleculares que consistirão na análise de DNA para a detecção do gene defeituoso responsável pela manifestação da patologia.

 O estágio mais crítico da DH consiste na incapacidade do doente em executar atos simples como falar e engolir, por mais que ainda possa reconhecer pessoas que circulem ao seu redor como familiares e amigos. Disfagias e engasgos são bastante comuns nessa fase e são responsáveis por boa parte da mortalidade de paciente que possuem a DH. “A imobilidade causada pela doença é sim a grande responsável pela mortalidade do portador e não a doença em si”. Traumatismos e infecções são outros fatores que podem complicar ainda mais a vida do paciente crítico. Vale ressaltar a alta taxa de suicídios entre pessoas que manifestam a síndrome, pois o diagnóstico de uma doença que causará sua morte aos poucos, pode levar o indivíduo a perder a “razão do viver”.

 As dificuldades no diagnóstico não são muitas, já que o quadro da doença é bem característico. As complicações surgem quando esta se manifesta de forma precoce ou quando o paciente não apresenta antecedentes familiares huntingtonianos.

                                              
                                              
 Não há cura para o problema, nem sequer uma forma de evitar que a doença se agrave. O tratamento feito junto ao especialista consiste em retardar os sintomas e manter as capacidades funcionais do indivíduo o máximo de tempo possível. Medicamentos a base de bloqueadores dopaminérgicos podem suavizar movimentos e comportamentos anormais. O uso dos antioxidantes como a coenzima Q10 e o tocoferol, suplementos nutricionais como a creatina e a nicotinamida, além da restrição nutricional ao ferro podem aliviar um pouco o processo de neurodegeneração. Outras formas de tratamento farmacológico consistem em antipsicóticos contra Coréia e bradicinesia, antidepressivos contra depressão e alterações de humor que o paciente venha a manifestar, ansiolíticos no combate à ansiedade, hipnóticos em relação à insônia, e até mesmo estimuladores de apetite, já que em estágios mais avançados da doença o paciente perde peso com muita facilidade devido à série de dificuldades que possui para se alimentar. Formas não-farmacológicas de lidar com o problema também podem ser empregadas. O acompanhamento do paciente e da família junto a um psicólogo é essencial na tentativa de assimilação do diagnóstico chocante e das implicações futuras que aquilo causará. Terapias acessórias como as nutricional, da fala e cognitiva também são fundamentais como melhora para o ânimo e bem-estar do paciente a nível de coordenação motora, digestão, aprendizagem e expressão oral, fazendo com que o indivíduo não perca estas habilidades de forma tão prematura. A grande expectativa para o futuro é que o implante de células estaminais nas áreas cerebrais afetadas possa substituir os neurônios que foram destruídos e assim desacelerar o processo de degeneração.
                  
                                       
                                   George Huntington, descreveu a doença.

Referências Bibliográficas
1-Huntington´s Disease Colaborative Research Group. A novel gene containing a trinucleotide repeat that is expanded and unstable on Huntington´s disease chromosomes. Cell 1993;72:971-83.
Willard. TM. Padrões de herança monogênica. In Willard TM. Thompson e Thompson Genética Médica.Quinta edição.pág. 38-68.Rio de Janeiro-RJ,1991.
2-Adams RD, Victor M: Neurologia. 5 edição, São Paulo, 1996.[
3-Guyton AC, Hall JE. O cerebelo, os gânglios da base e o controle motor global. In Guyton AC: Tratado de fisiologia Médica, 9th Ed. Guanabara Koogan. Rio de Janeiro – RJ, 1996
4-Jankovic J: Os distúrbios extrapiramidais. In: Bennet JC, Plum F. Cecil Tratado de Medicina Interna, volume2, 20 edição. Rio de janeiro, Guanabara Koogan 1997.
5- BACHESCHI, LA. ; FORTINI, I. In: NITRINI R. BACHESCHI, LA. (Eds.) A neurologia que todo omédico deve saber. São Paulo, SP: Editora Atheneu, 2005; pág. 366.